A residência somsocosmos foca no som, em suas mais impensadas variantes. A amplitude da chamada resulta numa grande variedade de propostas em torno do sonoro.

A quinta edição da residência aconteceu entre os dias 10 e 25 de Março de 2024 e convocou músicos, cantores, poetas, engenheiros de som, artistas sonoros, ruidistas, curadores, instrumentistas e performers, provenientes de Alemanha, Brasil, Bélgica, Colombia e Suiça.

Anna Vis, Sávio de Queiroz e Julio Santa Cecília, além de participar como residentes, fizeram parte da equipe de gravação junto com Benoit Bellet. A presença deles no estúdio resultou num “ocupamento” do mesmo; a toda hora alguém gravando, mixando, escutando. Novas parcerias acontecendo,  pessoas e sonoridades se mesclando em projetos coletivos. Esta presença no processo de gravação se reflete no album, que também foi mixado e masterizado na sua maioria por Anna Vis e Sávio de Queiroz. Abro a pergunta então, como se influenciam os processos técnicos e criativos?

Além do estúdio de gravação, uma pequena capela localizada a uns poucos metros da casa principal, mas afastada o suficiente para fazer barulho até altas horas da noite, se configurou como ponto de encontro. Bruno Qual, morador da Fazenda São João, disponibilizou seus equipamentos de som, o que facilitou que improvisações e gravações acontecessem ali.  A reverberância da capela é o room tone de algumas das composições. A capela, a locação dos encontros.

E qual é o ambiente desta história? A Residência São João está situada na região serrana de Rio de Janeiro, cujo bioma é de transição entre a Mata Atlântica e o Cerrado. Aqui você pode escutar uma variedade interminável de aves, insetos, anfibios, texturas. O silêncio não existe. O cenário ideal para aqueles que, como eu, realizam gravação de campo...Já percebeu as cigarras tocando junto dos residentes?

O projeto The Gap, de Marco Felinto e Simon Grab, com apoio da Pro-Helvétia, foi desenvolvido durante a residência. Felinto (BR) e Simon Grab (CH) são dois artistas sonoros que trabalham com um amplo escopo de ações, que incluem arte/tecnologia, ativação de tecnologias ancestrais e práticas ativistas ligadas a estudos decoloniais. Ambos exploram, cada um em seu contexto, os extremos da aplicação do som como uma forma de produção de narrativa utópica.

Em 2022 a dupla iniciou uma série de colaborações de performance/mediação educacional denominada THE GAP - no contexto da residência SOMSOCOSMOS 4(RSJ).

THE GAP é um projeto de criação colaborativa situado entre os campos da arte e da política. Seu objetivo é detectar tensionamentos ligados à questões de identidade e gerar dispositivos de mediação que impliquem coletividades em interação no manejo de questões sensíveis.


Desta vez, os artistas se propuseram a dar continuidade ao projeto THE GAP e investigar/confrontar o imaginário colonial presente nas artes decorativas, utensílios domésticos, mobiliário, fotografia, arquitetura e maquinário, como forma de simbolizar o não dito/proibido, remetendo à própria história da fazenda, da casa e das relações humanas que compõem essa comunidade. Uma busca por processos de transformação e permanência, com o objetivo de gerar um caminho de simbolização que parta de práticas coletivas.

As ações levadas por The Gap estão se desdobrando ainda. Foram gerados o memorial Yangí, uma sessão de escuta sobre identidade e território, o ritual das velas no espaço da antiga senzala, uma publicação das perguntas criadas na sessão de escuta (jogo de cartas para mediação) e um artigo. Ambos estarão na próxima edição da revista Sikudhani, de Anansi Lab.

Todas estas ações são dispositivos para a fala, escuta  e mediação em torno de memórias da colonialidade.

Paralelamente à Somsocosmos, a Casa Figueira, naquele momento com curadoria da Ynaiê Dawson, recebeu quatro residentes com pesquisas sobre artes visuais, escrita e pensamento decolonial.  Federico Barea, Lucia Moore, Pedrosa e Thais Medeiros habitaram a casa e estabeleceram cruzamentos e diálogos com os residentes da Somsocosmos. Um dos projetos que mais impacto teve durante a residência foi a oficina de Letramento racial , oferecida pelo Pedrosa, um dos diretores de Anansi Lab.

Vizinhos e moradores da Fazenda também participaram da residência, na equipe da cozinha, em improvisações coletivas, nos jogos de bola na piscina ou no evento final de Portas Abertas, onde os artistas residentes apresentaram os processos e trabalhos desenvolvidos durante as duas semanas de imersão.

Participaram da Somsocosmos 5:
Anna Vis, Carina Stiefel, Esteban Ferro, Felinto, Gabriel Edé, Henry Weekes, Jeanne Callegari, Juliano Gentile, Julio Santa Cecília, Louise Jonard, Murillo Marques (aka Antigo), Bella com som, Savio de Queiroz, Simon Grab, The Gap (com apoio da Pro-helvetia)

Curadoria:
Antonio Sobral, Marcos Felinto e Verónica Cerrotta